Juan Fernando

“Tarde Vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei!” 

Nunca imaginei que me converteria ao Catolicismo! Na verdade, até o dia em que decidi abraçar a Fé, jamais havia colocado os meus pés em uma Igreja Católica. Quando criança, apesar da maior parte dos meus parentes se declararem católicos, fui batizado em uma Igreja… Ortodoxa! Sim! Até hoje ninguém soube explicar o motivo, mas fui batizado como cristão ortodoxo antioqueno.

Com o passar dos anos, minha família, que já não tinha tanta ligação com o Catolicismo, abraçou em peso ao Pentecostalismo. Com seis anos de idade já frequentava igrejas evangélicas e cresci neste ambiente. Sempre fui assíduo nos trabalhos da igreja e frequentava uma Assembleia de Deus do Distrito de Xerém em Duque de Caxias, Baixada Fluminense. Mais tarde, me mudaria para a cidade de Angra dos Reis, litoral sul do Rio de Janeiro, onde frequentaria outra das inúmeras Assembleias de Deus ali existentes.

Sempre fui apaixonado por história e gostava de conhecer a história de tudo que estava ao meu redor. A mudança para Angra dos Reis, uma das mais antigas cidades do Brasil, fez com que tal fascínio só aumentasse. Mas algo na cidade me incomodava: é que, ao contrário de Duque de Caxias, a quantidade de templos católicos em Angra era considerável! Pior: Havia uma quantidade considerável de procissões católicas em toda a cidade e durante todo o ano.

“Idólatras,” resmungava este pobre adolescente pentecostal, revoltado com o fato de viver em uma cidade tão agarrada às suas tradições católicas. Tradição! Palavra que me encantava, mas que me aborrecia, pois não conseguia encontrá-la no meio protestante pentecostal. Se por um lado não encontrava uma “tradição pentecostal”, por outro lado pouco sabia sobre a história do próprio pentecostalismo e, ao conversar com outros pentecostais, percebia que eu sabia até mais do que a maior parte deles. Foi aí então que decidi entrar em uma empreitada: pesquisar e descobrir a história do Pentecostalismo no Brasil.

Comecei indagando pastores – não foram poucos – sobre, não só a história, como a teologia do movimento pentecostal. Em que cremos? Por que cremos assim? Qual é a diferença de nós para os demais protestantes? Fiquei perplexo ao perceber que a maior parte deles quase nada sabia sobre a história da própria fé que diziam professar. Se quisesse descobrir algo, teria que tentar de outras formas.

Entrei em contato com outros pastores pentecostais, mas ao conhecer a história, percebi que havia uma espécie de vácuo – não sei dizer se este seria o termo correto – um sentimento de falta de sentido na própria história do movimento pentecostal. Boa parte de suas doutrinas eram baseadas em sentimentalismos e em diversas misturas de interpretações bíblicas de outros movimentos. A história do Pentecostalismo se resumia a movimentos sentimentais, brigas internas e mil e uma divisões. Não havia uma doutrina. Qualquer um podia crer em qualquer coisa e se autodeclarar pentecostal e estava tudo certo! Não havia algo ou alguém que julgasse se tal doutrina era legítima ou não. Tudo era baseado na interpretação bíblica de cada um.

Decidi então compreender como tudo aquilo se criou, estudando a fundo o que foi a Reforma Protestante. Ali, tive o primeiro “baque”: boa parte do que as igrejas históricas do Protestantismo criam não era crido pelos pentecostais e vice-versa! Ao sair do meu “mundo particular pentecostal”, passei a perceber que, por uma série de outras confissões ditas protestantes, o Pentecostalismo sequer era reconhecido como um movimento legítimo!

Durante a pesquisa, passam-se os anos, passa-se o Centenário das Assembleias de Deus no Brasil – que sequer foi comemorado com afinco pela maioria dos membros das Assembleias de Deus – sirvo às Forças Armadas, saio delas, me caso e, quanto mais eu procurava entender como ocorreram tantas divisões no Protestantismo, mais perdido eu ficava. Neste interim, conheci o Calvinismo através dos sermões do Reverendo Augustus Nicodemus. Confesso: fiquei encantado com aqueles sermões sérios, sem gritos, sem pessoas babando e se contorcendo no chão e sem músicas sentimentais ao fim das pregações. Mas o encanto durou até conhecer a doutrina calvinista, com sua ideia de “juridicismo,” cheia de determinismos de todas as ordens… Faltava algo ali e por trás de todos aqueles belos e sérios sermões, havia tábuas de pedra onde, como li em algum lugar, não se condenava o mau uso de coisas boas, mas sim as coisas boas por si só.

Chegando neste ponto, senti-me cansado. Cansado de procurar… Mas, o que eu procurava? Sentido, lógica, história… Uma Fé que suportasse os vendavais do mundo e da mente humana! Mesmo os meus amigos protestantes mais apaixonados pela Reforma não tinham respostas para me dar e não conseguiam me convencer que todas aquelas divisões doutrinárias era “algo normal”, ou mesmo um “mal menor”. Ia aos cultos de domingo me arrastando, mais por amor a Deus e responsabilidade com alguns cargos que ocupava do que por vontade própria, sabendo que não veria nada mais que animadores de palco, berrando, chorando e gritando nos microfones da Assembleia de Deus que eu ainda era membro. Ainda assim, não deixava transparecer meu desânimo, trabalhando inclusive em partes administrativas da igreja. Mas meu coração já não estava mais ali. Não via lógica em nada daquilo, mas tentava fingir para todos que estava tudo bem. Fingir… por quanto tempo conjuguei e vivi este verbo nos meus últimos anos como protestante? Por muito tempo, sem dúvida!

Porém, certo dia, ao terminar de estudar a Igreja Luterana, percebendo inclusive que a “Igreja Mãe do Protestantismo” já não tinha unidade doutrinária nela própria, decidi que era a hora de conhecer a versão católica dos fatos. Até aqui, tudo o que sabia e conhecia vinha do ponto de vista protestante e, se queria de fato conhecer o que tinha sido a Reforma, precisava conhecer o outro lado da história.

Como não sabia quase nada de Catolicismo, decidi procurar obras de católicos brasileiros influentes que pudessem dar ao menos uma noção do que de fato era o Catolicismo. Foi aí que conheci um certo padre… Um tanto desconhecido – poucos devem conhecê-lo. Era um tal de Padre Paulo Ricardo de Azevedo Junior. Li sobre sua história de vida e decidi, antes de mais nada, assistir alguns de seus vídeos.

O primeiro que encontrei me fez raiva só pelo título: “Por que não sou protestante?”. Mas respirei fundo e decidi assistir com calma aquele e outros tantos. Na medida em que ia assistindo, minha raiva aumentava, porém, ao ouvir seus argumentos, percebia o pior: eles faziam sentido e aquilo me aborrecia ainda mais! No fim, aquele padre disse uma frase que mudaria, não só o resultado da minha pesquisa, como minha vida. Disse ele: “Quer ver um protestante deixar de ser protestante? É só ele estudar os Santos Padres! É tiro e queda! Eu DESAFIO qualquer protestante a estudar a Patrística de modo sério e permanecer protestante.”

Aquilo para mim foi uma afronta e disse à tela do computador: “Ah, é? Veremos! Desafio aceito!” E eu nem sabia que raios era a Patrística e muito menos quem eram os tais “Santos Padres”, mas caí neste Universo Católico da leitura. Eu não imaginava o que me esperava…

A cada leitura, uma surpresa! Via na descrição de Justino Mártir sobre os antigos cultos cristãos os mesmos elementos do que, aparentemente – pois ainda não havia colocado meus pés em um templo católico – era uma Missa!

Via na defesa da Unidade da Igreja, de São Cipriano, uma condenação às inúmeras divisões e o louvor a uma única Igreja sob a direção de…PEDRO! O que mais me deixou estupefato foi perceber que São Cipriano morreu por volta de 258! E eu acreditava que a Igreja Católica tinha sido criada por Constantino em 313! Mas como isso seria possível?

Como se não bastasse, conheci um rapaz, hoje mais do que um amigo: um irmão! Deus enviou até a mim um jovem católico de Imperatriz do Maranhão chamado Tallick que, do nada, começou a me tirar uma série de dúvidas sobre a Igreja – muitas delas hilárias, frutos do total desconhecimento do que era o Catolicismo.

No fim dessa história, tomei o golpe de misericórdia: conheci a História de Santo Agostinho em suas Confissões. Ali, mesmo no início da leitura daquele livro, já sabia no meu coração que havia perdido a aposta para aquele padre Paulo, mas ainda não queria aceitar. Porém, ao fim daquele livro, ao ler o poema “Tarde vos amei”, minhas resistências caíram por terra e comecei a chorar em casa, sozinho. Era o sábado de Aleluia de 2016, eu tinha 23 anos de idade e um ano de casado. Pensei comigo mesmo: preciso de uma prova final! Farei algo que nunca imaginei fazer! Vou à Igreja Católica pela minha primeira vez.

Às 18hs00min, cheguei na Paróquia Cristo Rei, em Angra dos Reis. Não conhecia ninguém ali, não sabia muito bem como agir e nem sabia o que de fato era um “Sábado de Aleluia”. Segui a procissão que saiu do Centro Paroquial até à Igreja Matriz, onde cânticos eram entoados ao Cristo Ressuscitado – e eu que sempre fui ensinado na Assembleia de Deus que a Igreja Católica cria em um “Deus morto”.

Por fim, ao fim daquela Missa, naquela mesma noite, fui procurar o pároco daquela Igreja, padre Cícero. Ali, naquele Sábado de Aleluia, nasci para Cristo e pude enfim compreender o poema de Santo Agostinho: “Tarde Vos amei! Oh, Beleza tão antiga e tão nova! Tarde vos amei!”

Minha história ainda é um pouco mais longa. Não foi fácil sair de um circulo social onde cresci, casei e vivi por tanto tempo. Perdi amizades, passei por certas crises pessoais, poucos daqueles que me conheciam compreenderam ou aceitaram minha decisão. Não tem importância! Tudo valeu a pena!

Hoje, ao olhar para a Igreja – este navio em alto mar, açoitado por inúmeros vendavais – olho para os céus e agradeço a Deus: este pobre miserável que vos escreve, depois de tanto tempo, enfim encontrou sua casa: a Santa Madre Igreja!

1 Juan Fernando, nasceu em 1993, reside em Ubatuba (SP), pertenceu à Assembleia de Deus, converteu-se em 2016. Cursando nível superior em História. E-mail para contato: juanfernandobrasil@gmail.com