Assim como na antiga aliança os homens iam ao templo para adorar a Deus, na nova aliança a Igreja se reúne em torno do novo templo, o corpo de Cristo .

Esse texto é, de certo modo, parte do meu testemunho de retorno à Santa Igreja, que você pode conferir clicando aqui.

Quis a providência divina que em um domingo do ano de 2017 eu fizesse um estudo bíblico na passagem de João 2 — Jesus expulsando os mercadores do templo. Digo que foi a providência divina pois, ao estudar essa passagem, minha mente se abriu para uma verdade que eu jamais desconfiara e que me ajudou a descobrir a verdadeira Igreja.

Cristo e o Templo

Logo depois da expulsão dos mercadores do templo, acontece o seguinte diálogo:

Responderam, pois, os judeus, e disseram-lhe: Que sinal nos mostras para fazeres isto?
Jesus respondeu, e disse-lhes: Derrubai este templo, e em três dias o levantarei.
Disseram, pois, os judeus: Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três dias?
Mas ele falava do templo do seu corpo.
Quando, pois, ressuscitou dentre os mortos, os seus discípulos lembraram-se de que lhes dissera isto; e creram na Escritura, e na palavra que Jesus tinha dito.

João 2:18-22

Como protestante eu já tinha lido essa passagem dezenas de vezes, mas nunca tinha parado para pensar nas implicações da fala de Jesus. Sempre imaginei que quando Jesus diz “em três dias o levantarei” fosse apenas uma afirmação do seu poder divino que seria demonstrado na ressurreição. Não tinha reparado como a frase do narrador São João traz outras implicações: “ele falava do templo do seu corpo”.

Ele fala que levantaria esse novo templo em três dias, fazendo referência ao seu corpo ressucitado. É importante, antes que se prossiga a exposição, saber qual a natureza desse novo corpo de Cristo.

Em primeiro lugar, Jesus subiu aos céus em corpo.

Vemos muitas vezes a Escritura referir-se a Cristo como sendo o Cordeiro, João Batista, por exemplo, faz uso dessa alegoria. Tão importante foi essa imagem para a cristandade que até hoje o padre, antes do momento da comunhão eucarística, cumprindo seu ministério profético, repete as palavras do Batista “Eis o Cordeiro de Deus, eis aquele que tira o pecado do mundo.” Essa imagem de Jesus como Cordeiro reaparece nas visões de João, no Apocalipse.

“E olhei, e eis que estava no meio do trono e dos quatro animais viventes e entre os anciãos um Cordeiro, como havendo sido morto, e tinha sete pontas e sete olhos, que são os sete espíritos de Deus enviados a toda a terra.”

Esse Cordeiro que João viu é o Jesus Ressucitado, aquele que passou pela cruz. O Cordeiro, como havendo sido morto, que está glorioso junto ao Pai. Tão importante é a crença sobre a glorificação de Jesus, que ela está presente no Símbolo Apostólico. 

[Jesus foi] morto e sepultado, desceu a mansão dos mortos, ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus e está sentado a direita de Deus Pai

O corpo de Cristo é também a sua Igreja.

O II Concílio do Vaticano nos ensina:

«Comunicando o seu Espírito aos seus irmãos, por Ele reunidos de todas as nações, [Jesus] constituiu-os seu Corpo Místico» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 7: AAS 57)

Cristo e a Igreja formam o Christus totus. Por isso que podemos dizer ‘extra ecclesiam nulla salus’ (fora da Igreja não há salvação), pois não há salvação fora de Cristo, e Ele é a sua Igreja. Ele é o cabeça e nós somos o seu corpo, portanto, quem está em Cristo, está na Igreja.

Mas Ele falava do templo do seu corpo

Além de tudo o que foi dito acima, há outra verdade sobre o Corpo de Cristo que podemos extrair da passagem de João 2, que é: “ele falava do templo do seu corpo”. 

O corpo de Jesus é um templo! O que era o templo na antiga aliança? Era muitas coisas, mas, acima de tudo, era um lugar de culto.

Assim como na antiga aliança os homens iam ao templo para adorar a Deus, na nova aliança a Igreja se reúne em torno do novo templo, o corpo de Cristo. De fato, Ele construiu para nós um templo, o templo do seu corpo.

O corpo de Cristo é, portanto, o ponto de partida do culto cristão. Foi muito conveniente descobrir isso naquela época, pois liturgia era um dos temas que me inquietavam bastante. Eu estava justamente procurando bases firmes onde eu pudesse construir minha ideia de culto e encontrei a melhor de todas, o corpo de Nosso Senhor.

A Igreja Primitiva compreendeu muito bem o princípio fundador do culto como sendo o corpo de Cristo, pois o Apóstolo, ao exortar os corintos, afirma:

Porventura o cálice de bênção, que abençoamos, não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo?
Porque nós, sendo muitos, somos um só pão e um só corpo, porque todos participamos do mesmo pão.

1 Coríntios 10:16,17

Está claro que ele se refere tanto à universalidade litúrgica da Igreja, como ao modo que isso se dá. Se o Corpo de Cristo é o novo templo, é nele que devemos nos reunir, e como seria isso senão pela própria Eucaristia? Em uma paráfrase, seria como se ele dissesse:

O pão que partimos no nosso culto é o próprio corpo de Cristo. Nós somos muitos e estamos espalhados pelo mundo, mas fazemos o mesmo culto: comemos do pão eucarístico, que é o corpo de Cristo.​

O culto cristão é a reunião do povo de Deus no Corpo de Cristo

Muitos autores protestantes negam que há algo como “universalidade de culto”. Li um que pensava que o culto cristão deveria apenas seguir o critério do “amor e da felicidade coletiva”, sem qualquer outro princípio norteador. O culto cristão seria essa coisa amorfa e oca, ao gosto do homem e de sua cultura. Talvez seja por isso que o protestante não se incomoda que seu culto seja tão recente na história; basta justificar dizendo que é o culto que corresponde ao ethos do seu povo e que não existe “universalidade cúltica” que o possa julgar.

A verdade é que se o teólogo protestante estiver certo, não existe culto. O culto a Deus deve ser feito com uma oferta de sacrifício. Onde está o sacrifício no culto protestante? Não está presente. Na melhor das hipóteses ele está na memória do povo, o que só reforça o caráter gnóstico do protestantismo. O zwinglianismo, que é negação completa da teologia sacramental, é o ressurgimento da heresia gnóstica e já foi vencido no campo das ideias há muito tempo, o que, infelizmente, não o impede de retornar.  

Há algo na liturgia cristã que precisa ser imutável e válido para todos os homens de todos os tempos e culturas, assim como é na doutrina, pois isso vem da própria essência da Igreja. Quando entendi isso, comecei a me aproximar do que a Igreja Católica chama de Missa. 

Concluo dizendo que essa imagem do homem que encontra Deus no corpo de Cristo, fazendo assim o seu culto, se encontra perfeita e plenamente no entendimento católico da comunhão da eucaristia. 

A missa é, portanto, o verdadeiro culto cristão, pois é o momento em que o povo de Deus se reúne no novo templo, o Santíssimo Corpo de Nosso Senhor.

Matheus Andrade

Sou católico, tenho 23 anos e moro em Natal/RN.