A Eucaristia: eterno sacrifício do Senhor imolado e ressuscitado

Assim diz o Catecismo da Igreja:

“Quando a Igreja celebra a Eucaristia, rememora a Páscoa de Cristo, e esta se torna presente: o sacrifício que Cristo ofereceu uma vez por todas na cruz torna-se sempre atual: Todas as vezes que se celebra no altar o sacrifício da cruz, pelo qual Cristo nossa Páscoa foi imolado, efetua-se a obra da nossa redenção. Por ser memorial da páscoa de Cristo, a Eucaristia é também um sacrifício. O caráter sacrifical a Eucaristia é manifestado nas próprias palavras da instituição: ‘Isto é o Meu Corpo que será entregue por vós’, e ‘Este cálice é a nova aliança em Meu Sangue, que vai ser derramado por vós’ (Lc 22,19s).

Na Eucaristia, Cristo dá este mesmo corpo que entregou por nós na cruz, o próprio sangue que ‘derramou por muitos para remissão dos pecados’ (Mt 26,28)” (Catecismo da Igreja Católica, 1365).

A Celebração Eucarística é, portanto, memorial, isto é, o tornar-se presente, no aqui e no agora da vida da Igreja e da vida de cada um de nós, daquele único e irrepetível sacrifício que Jesus ofereceu na cruz e que o Pai acolheu na Glória da Ressurreição. “O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício: ‘É uma só e mesma Vítima, é o mesmo que oferece agora pelo ministério dos sacerdotes, que Se ofereceu a Si mesmo então na cruz. Apenas a maneira de oferecer difere” (Catecismo, 1367). Cristo, Sacerdote eterno, é também eterna Vítima, eterna Hóstia, eterno Cordeiro, que Se oferece num sacrifício eterno, tornado presente no altar da Igreja! Ele, que Se ofereceu na cruz em dores, torna-Se presente nos nossos altares como agora Se encontra: de pé como que imolado, em eterno sacrifício agora glorioso!

Assim, a Eucaristia torna presente, “presentifica”, o único e irrepetível sacrifício do Cristo salvador; sacrifício que o Senhor Jesus deu à Sua Igreja para que ela o ofereça até que Ele venha em Sua Glória. Por isso mesmo, é chamado de sacrifício de louvor, sacrifício espiritual (porque oferecido na força do Espírito Santo), sacrifício puro e santo (porque sacrifício do próprio Cristo Jesus). Este santo sacrifício da Missa leva à plenitude todos os sacrifícios de todas as religiões e, particularmente, aqueles do Antigo Testamento.

Podemos até recordar as palavras da profecia de Malaquias, na qual Deus prometia a Israel um sacrifício perfeito ao Seu Nome: “Sim, do levantar do sol ao seu poente o Meu Nome será grande entre as nações, e em todo lugar será oferecido ao Meu Nome um sacrifício de incenso e uma oferenda pura” (1,11). Cristo, com Seu sacrifício único e irrepetível, que entregou à Sua Igreja para celebrá-lo até que Ele venha, ofereceu este sacrifício, cumprindo a esta profecia.

Mas, quando a Igreja fala em sacrifício de Cristo, ela não pensa simplesmente no que aconteceu no Calvário. Toda a existência humana de Jesus teve um caráter sacrifical. O Autor da Carta aos Hebreus, falando do Cristo o momento de Sua Encarnação, afirma: “Ao entrar no mundo, Ele afirmou: ‘Tu não quiseste sacrifício e oferenda. Tu, porém, formaste-Me um corpo. Holocaustos e sacrifícios pelo pecado não foram do Teu agrado. Por isso Eu digo: Eis-Me aqui, – no rolo do Livro está escrito a Meu respeito – Eu vim, ó Deus, para fazer a Tua vontade” (Hb 10,5).

Jesus viveu a toda Sua vida entre nós, desde o primeiro momento, no amor, no abandono, na obediência, como uma oferta sacrifical ao Pai para nossa salvação. Toda esta existência sacrifical e sacerdotal chegou ao máximo no sacrifício da cruz. Ali, naquele acontecimento tremendo, verificou-se a palavra da Escritura: “Tendo amado os Seus que estavam no mundo, amou-os até o extremo” (Jo 13,1). Assim sendo, quando celebramos a Eucaristia, é toda esta vida sacrifical, esta vida doada aos irmãos por amor ao Pai, que se torna presente sobre o altar para a nossa salvação. Mais ainda: como esta entrega, consumou-se com a resposta do Pai ao Seu Filho, ressuscitando-O dentre os mortos, a Eucaristia é o próprio mistério pascal: no altar, pela ação potente do Espírito, torna-se misteriosamente presente a existência humana de Jesus inteira: Seus dias entre nós, Sua paixão, morte, sepultura, Sua ressurreição e ascensão e até mesmo a certeza da Sua Vinda gloriosa:

“Celebrando, agora, ó Pai, a memória da nossa redenção, anunciamos a morte de Cristo e Sua descida entre os mortos, proclamamos a Sua ressurreição e ascensão à Vossa direita, e, esperando a Sua Vinda gloriosa, nós Vos oferecemos o Seu Corpo e Sangue, sacrifício do Vosso agrado e salvação do mundo inteiro” (Oração eucarística IV).

Porque é o sacrifício do próprio Cristo, Filho de Deus feito homem, numa total obediência amorosa ao Pai por nós, a Eucaristia é aquele sacrifício perfeito de que falava a profecia de Malaquias 1,11. É o que afirma a própria liturgia : “Por Jesus Cristo, Vosso Filho e Senhor nosso, e pela força do Espírito Santo, dais vida e santidade a todas as coisas e não cessais de reunir o Vosso povo, para que Vos ofereça em toda parte, do nascer ao pôr-do-sol, um sacrifício perfeito” (Oração Eucarística III).

A Igreja oferece, pois, este santíssimo sacrifício, de eficácia e valor infinitos, pelos vivos e pelos mortos, por crentes e descrentes e até mesmo por toda a criação: “E agora, ó Pai, lembrai-Vos de todos pelos quais Vos oferecemos este sacrifício: o Vosso servo, o Papa, o nosso Bispo, os bispos do mundo inteiro, os presbíteros e todos os ministros, os fieis que, em torno deste altar, Vos oferecem este sacrifício, o povo que Vos pertence e todos aqueles que Vos procuram de coração sincero” (Oração Eucarística IV).

Neste sacrifício perfeito e infinito, a Igreja louva, agradece, suplica, pede perdão, adora e intercede por si e pelo mundo inteiro, tudo isto unida ao próprio Cristo, seu Cabeça e Esposo. Por isso, nenhuma outra celebração se iguala ao Sacrifício eucarístico em força, santidade e eficácia.

Celebrar este sacrifício santo nos compromete profundamente, seja pessoalmente seja como Igreja: “O cálice de bênção que abençoamos, não é comunhão com o Sangue de Cristo? O pão que partimos, não é comunhão com o Corpo de Cristo?” (1Cor 10,16). Segundo estas palavras de São Paulo, participar da Eucaristia é participar da vida sacrifical de Jesus, é estar dispostos a fazer de nossa vida uma participação no Seu sacrifício, completando em nossa existência o mistério da cruz do Senhor (cf. Cl 1,24). Em cada Eucaristia, com Jesus, oferecemos ao Pai a nossa própria vida. Eis como nossa participação no sacrifício eucarístico nos compromete profundamente! Não poderia participar desse Altar quem não estivesse disposto a se oferecer cada dia com Cristo e como Cristo: “Exorto-vos, portanto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus; este é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito” (Rm 12,1-2).

Pode-se perguntar de que modo um acontecimento ocorrido há dois mil anos pode se tornar presente sobre o Altar. É importante compreender o que significa o “memorial”. Não significa simplesmente recordação ou memória. Nas Escrituras, memorial é dito zikaron e significa tornar presente, por gestos, símbolos e palavras, um fato acontecido no passado uma vez por todas. Uma vez ao ano, os judeus celebravam e celebram ainda hoje a Páscoa, memorial da saída do Egito. Nessa celebração, eles não somente recordam a passagem da escravidão para a liberdade, mas tinham e têm a consciência de que, participando da celebração, participam realmente da própria libertação que Deus operara naquele acontecimento passado. Tanto isso é verdade que, ainda hoje, aquele que preside à celebração, diz assim: “Em toda geração, cada um deve considerar-se como se tivesse pessoalmente saído do Egito, como está escrito: ‘Explicarás então a teu filho: isto é em memória do que o Senhor fez por mim, quando saí do Egito’. Portanto, é nosso dever agradecer, honrar e louvar, glorificar, celebrar, enaltecer, consagrar, exaltar e adorar a Quem realizou todos esses milagres por nossos pais e para nós mesmos. Ele nos conduziu da escravidão à liberdade, do sofrimento à alegria, da desolação a dias festivos, da escuridão a uma grande claridade e do cativeiro à redenção”. E, depois, acrescenta: “Bendito sejas Tu, Adonai, nosso Deus, rei do universo, que nos redimiste, libertaste nossos pais do Egito, e nos permitiste viver esta noite para participar do Cordeiro, do pão ázimo e das ervas amargas”.

Ora, é exatamente isso que a Eucaristia é: memorial da Páscoa do Senhor Jesus! Quando nós a celebramos, torna-se presente no nosso hoje, na nossa vida, na nossa situação, tudo quanto Jesus fez por nós, que alcança seu cume na Sua morte e ressurreição. Jesus, imolado e ressuscitado, com Sua oferta e Sua vitória, não Se encontra no passado, mas na Glória e em cada Celebração eucarística, torna-se realmente presente no altar! Deste modo, a Páscoa do Senhor está sempre presente e atuante na nossa vida e, através de Jesus e com Jesus, podemos dizer ao Pai como os judeus dizem: “é nosso dever agradecer, honrar e louvar, glorificar, celebrar, enaltecer, consagrar, exaltar e adorar a Ti, Adonai, Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo!” Então, em cada missa torna-se presente, atuante, o único sacrifício pascal do Senhor, memorial de Sua encarnação, de Sua vida humana, de Sua paixão, morte e ressurreição, de Sua ascensão ao Pai e do dom do Espírito que Ele nos fez!

Resta apenas recordar que tudo isso acontece na força do Espírito Santo, Aquele mesmo Espírito eterno no qual Jesus ofereceu-Se ao Pai como vítima sem mancha (cf. Hb 9,14). É este Espírito Santo que, transfigurando o pão e o vinho, torna presente sobre o Altar o Cristo morto e ressuscitado, glorioso, mas trazendo eternamente as chagas da paixão, numa oferta eterna, que jamais passará. Assim ensinava São João Paulo II: “A Igreja vive continuamente do sacrifício redentor, e tem acesso a ele não só através duma lembrança cheia de fé, mas também com um contato atual, porque este sacrifício volta a estar presente, perpetuando-se, sacramentalmente, em cada comunidade que o oferece pela mão do ministro consagrado. Deste modo, a Eucaristia aplica aos homens de hoje a reconciliação obtida de uma vez para sempre por Cristo para humanidade de todos os tempos. Com efeito, o sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício. Já o afirmava em palavras expressivas São João Crisóstomo: ‘Nós oferecemos sempre o mesmo Cordeiro, e não um hoje e amanhã outro, mas sempre o mesmo. Por este motivo, o sacrifício é sempre um só. […] Também agora estamos oferecendo a mesma Vítima que então foi oferecida e que jamais se exaurirá’. A Missa torna presente o sacrifício da cruz; não é mais um, nem o multiplica. O que se repete é a celebração memorial, a «exposição memorial de modo que o único e definitivo sacrifício redentor de Cristo se atualiza incessantemente no tempo. Portanto, a natureza sacrifical do mistério eucarístico não pode ser entendida como algo isolado, independente da cruz ou com uma referência apenas indireta ao sacrifício do Calvário” (Ecclesia de Eucharistia, 12).

Concluo ainda com as palavras de São João Paulo: “Quando a Igreja celebra a Eucaristia, memorial da morte e ressurreição do seu Senhor, este acontecimento central de salvação torna-se realmente presente e realiza-se também a obra da nossa redenção. Este sacrifício é tão decisivo para a salvação do gênero humano que Jesus Cristo realizou-o e só voltou ao Pai depois de nos ter deixado o meio para dele participarmos como se tivéssemos estado presentes. Assim, cada fiel pode tomar parte nela, alimentando-se dos seus frutos inexauríveis. Esta é a fé que as gerações cristãs viveram ao longo dos séculos, e que o magistério da Igreja tem continuamente reafirmado com jubilosa gratidão por dom tão inestimável. É esta verdade que desejo recordar mais uma vez, colocando-me convosco, meus queridos irmãos e irmãs, em adoração diante deste Mistério: mistério grande, mistério de misericórdia. Que mais poderia Jesus ter feito por nós? Verdadeiramente, na Eucaristia demonstra-nos um amor levado até ao “extremo” (cf. Jo 13,1), um amor sem medida” (Ecclesia de Eucharistia, 11).

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