A Obediência e a Verdade me levaram à Igreja
Testemunho – Paulo Gondim
É com muita alegria que escrevo este meu relato, que tem como modelo o testemunho de Fábio Salgado de Carvalho, e que será, obviamente, muito mais sucinto que o dele. Recomendo, veementemente, a leitura do relato referenciado, afinal, foi basilar para a construção deste e contém informações importantes que poderão sanar eventuais dúvidas.
Meu nome é Paulo Henrique Gondim Sobral, nasci em 17 de março de 1994, em Recife, capital pernambucana. Atualmente sou graduando de Direito, na Universidade Federal da Paraíba, em João Pessoa. Mais importante e respeitável que isso, sou aluno do Seminário de Filosofia do Professor Olavo de Carvalho, no qual a formação intelectual, moral e espiritual é muito mais digna que a futura posse de um diploma. Antes de esclarecer o contexto da minha conversão, quero pontuar os motivos pelos quais escrevo esse relato, já que algumas pessoas próximas me indagaram.
O primeiro motivo, e o mais significativo, é por considerar minha relação com Deus a prioridade da minha vida, pois nada nessa existência terrena teria sentido ou valor se minha alma não tivesse a oportunidade de entrar em contato com o Divino: minha conversão ao catolicismo é justamente um passo fundamental no estreitamento desse contato. Logo, deixar registrada minha decisão é uma das formas de comemorá-la. Em segundo lugar, escrevo por saber que existem pessoas que têm as mesmas dúvidas que eu tinha sobre a Fé e Doutrina Católica, e que precisam apenas de um “gatilho” para compreender, ou para buscar compreender. Esse relato pode ajudá-las a tomar a mesma decisão, como foi de grande ajuda o relato do Fábio para mim. Por último, é a forma que encontrei de minimizar os questionamentos em privado, evitando o desgaste de responder repetidamente às mesmas perguntas toda vez que me questionarem, visto ser normal as pessoas do meu convívio imediato e as que verdadeiramente se importam comigo terem curiosidade do real motivo da minha escolha (como alguns podem supor os motivos mais diversos e fúteis possíveis). Exposto isso, resta clara a finalidade da publicação do meu testemunho. Espero que atenda bem ao propósito.
Minha decisão de converter-me ao Catolicismo se deu, por uma coincidência cômica, no dia 29 de outubro de 2017, mês em que se comemorou os 500 anos da reforma protestante. A imagem que embeleza o início desse relato é a da conversão de São Paulo, do pintor espanhol Bartolomeu Estevão Murillo, que ilustra perfeitamente como compreendo meu processo de conversão: um verdadeiro encontro com a Luz.
Até chegar esse belo dia, foram 15 anos de jornada longe da Santa Igreja Católica. Fui criado no meio protestante, desde meus 08 anos de idade, sempre na mesma denominação, a Igreja Cristã Maranata com presbitério no estado do Espírito Santo. Fui batizado aos 15 anos e sempre fui bastante ativo nessa igreja. Desde os 14 anos, pelo menos, participei do grupo de louvor na parte de canto, no tanger de instrumentos musicais e exercendo a função de obreiro. Meus pais permanecem sendo membros dessa igreja e sempre foram ativos também: meu pai nas mesmas funções que eu exercia e minha mãe como professora da classe de adolescentes. Não posso jamais negar que, mesmo no protestantismo, tive experiências genuínas com o Eterno e que sou extremamente grato a todos que oraram e me apoiaram na caminhada nessa denominação. Talvez, algum protestante que leia isso alegue que eu não conhecia verdadeiramente o protestantismo ou que não sabia o que ele significa. Deixando de lado essa presunção tacanha e falsa, rapidamente questiono: qual deles eu deveria conhecer? Realmente, ficaria difícil encontrar o ‘verdadeiro’ protestantismo diante de uma multiplicidade absurda de doutrinas existentes. Será que o encontraria numa igrejinha pequena e independente lá no norte de Alagoas? Ou na Luterana? Ou na de Waldomiro Santiago, “apóstolo” da minha digníssima avó? Ou numa das, segundo fontes protestantes, 8000 denominações existentes? Não sei, bastante confuso e quase humanamente impossível conhecer todas as diversas doutrinas das diversas denominações espalhadas por aí.
Independentemente da denominação a que fui congregado, eu compreendi bem o valor do serviço a Deus. A Sua Palavra foi, por inúmeras vezes, o único consolo que encontrei para arejar a minha alma. Recebi livramentos de morte, cura de uma enfermidade, resposta de orações, entre tantas outras experiências que foram suficientes para ter prova da Misericórdia Divina, ainda que distante de Casa. Se minha experiência não tivesse sido real, minha alma não seria sedenta ao ponto de buscar continuamente a Verdade (que é Deus) para, finalmente, encontrá-la. Além disso, imerecidamente, o Senhor de Todas as coisas me contemplou com amizades verdadeiras (irmãos que eu nunca tive) das quais não abrirei mão independente da divergência de fé.
Aproveito esse momento para dizer que nada tenho contra os membros da minha antiga igreja e de nenhuma outra denominação protestante. Que fique claro que a divergência é doutrinária e não pessoal. No que de mim depender, a relação continuará amistosa, pois não há motivos para inimizade. Acredito piamente não precisar me delongar mais acerca da minha experiência como protestante, visto que não se trata do ponto principal. O importante já foi mencionado: eu tive, sim, uma experiência fidedigna com Deus nesses 15 anos. Quem quiser negar isso é apenas um tolo.
Contarei, então, como se iniciou meu processo de conversão. Terei antes que esclarecer algumas coisas importantes. Uma delas é que ninguém veio me evangelizar para que me tornasse católico. Absolutamente ninguém. Nem amigos de convivência diária, nem algum padre ou estudioso. A iniciativa foi minha, partindo do estudo solitário do catolicismo e de muita oração. Outra é, como já disse, que sou aluno do Seminário de Filosofia do Professor Olavo de Carvalho. E nesse curso aprendemos alguns preceitos basilares para a vida intelectual, e um deles é a honestidade intelectual. Tal preceito consiste em não criticar ou falar sobre algo do qual você não tem o mínimo de conhecimento. Atitude típica de brasileiro é adorar ter e emitir opinião sobre tudo, com ares de sabedoria ancestral, mesmo não sabendo sobre nada.
Comigo acontecia exatamente isso, tratando-se do Catolicismo. Era um “palpiteiro” inconsequente. Outro fato interessante é que grande parte das pessoas que souberam, por mim, da minha conversão, inclusive meus pais, acham que a “culpa” é do Professor Olavo de Carvalho. É risível, mas não os julgo por acharem isso, já que o Professor é realmente muito influente. Meus pais até acham que, embora eu tendo formação militar como Oficial da Reserva da Cavalaria (com experiência em armamento pesado e com blindados), minha vontade de portar uma arma é influência das aulas de Filosofia. As pessoas sentem uma necessidade urgente de achar um bode expiatório a todo custo, ao invés de aceitar que as ações e decisões podem partir de um indivíduo pensante.
Contrariando o raciocínio que essas pessoas tiveram, na verdade, eu comecei a ser aluno do COF numa época em que o Professor criticou duramente o protestantismo em sua conta no Facebook. E, na época, fiquei extremamente inconformado com os dizeres, mas deixei de lado por ter em mente apenas os ensinamentos filosóficos e políticos que ele tinha para oferecer, ou seja, se dependesse unicamente do que o Professor disse, enquanto aluno dele, talvez eu ficasse apenas na inconformidade e permanecesse no protestantismo, como uma gama enorme de alunos dele ainda permanece. No máximo, a “culpa” do Professor é indireta, devidos às exposições históricas que só fui assimilar após iniciar os estudos.
O único contributo real e direto do Professor na minha conversão, além do ensino dos preceitos e de boas amizades, foi ter sugerido, na sua página, que seguíssemos, na rede social, alguns dos seus alunos mais aplicados, dentre eles o Fábio Salgado de Carvalho. Esse, sim, teve influência direta no meu processo de conversão, ainda que não tenhamos conversado mais que quatro vezes (todos os diálogos iniciados por mim para retirada de dúvidas). Sou extremamente grato a Deus pela vida dele, que, sem saber, foi um instrumento decisivo nas mãos de Deus, com seu trabalho de traduções de textos católicos e de publicações lúcidas que me fizeram despertar para a realidade. Talvez ele não tenha ciência da importância do trabalho que ele realiza nas redes sociais. Mas, certamente, Deus o recompensará justamente, e ele estará sempre em minhas orações!
Retornando ao que disse, acerca do preceito da honestidade intelectual, eu interiorizei essa regra e passei a aplicar em tudo que faço. Desde então, mudei muito minha visão de mundo, porque realmente passei a me informar e a ler mais e não acreditar cegamente em tudo o que haviam me ensinado. Só que, a contragosto, deparava-me constantemente, desde junho, com as publicações do Fábio as quais contrariavam tudo o que eu compreendia sobre a Igreja Católica. Não é difícil de imaginar o quanto é aborrecedor ver sua fé contrariada continuamente. Porém me dei conta de uma verdade: eu não sabia absolutamente nada sobre o catolicismo por fontes católicas. Tudo o que eu “sabia” era terceirizado da boca de pastores ou sabichões protestantes, da emissão dos mesmos estereótipos consagrados (idólatras, povo que não lia a Bíblia, etc.), das suposições mais toscas (como o estranho caso de que todo novo Papa é o Anticristo) e dos espantalhos históricos (sobre a Inquisição, indulgências).
Nunca havia lido um livro ou sequer um mísero artigo católico. Todas as minhas certezas eram unilaterais, baseadas numa convicção arrogante e num delírio de sentir-me superior por saber da “verdade” tão óbvia. Afinal de contas, “como os católicos poderiam ser tão ignorantes ao ponto de não saberem o que está escrito na Bíblia? É tão simples ver que tudo o que eles acreditam contraria a Palavra de Deus”. Pois bem, eu pensava assim. E como diz o Professor Olavo de Carvalho: “o homem medíocre não acredita no que vê, mas no que aprende a dizer”.
Sim, eu vivia segundo essa mediocridade. Apenas repetia para todos, com pose de veracidade científica, as supostas verdades que jamais investigara. Fazia afirmações categóricas sobre a Doutrina Católica sem nunca ter lido, por exemplo, o Catecismo. Fundamentava meus argumentos históricos de acordo com livros apenas sob a ótica protestante. Fazia suposições bíblicas e proféticas segundo a conveniência do que eu acreditava. É deprimente, mas é verdade. Como eu poderia ser intelectualmente honesto dessa forma?
Busquei, então, informar-me por fontes católicas, para sanar esse mal. Observem que, quando me deparei com minha desonestidade e fui me informar, eu não tinha “intenções” de me converter, mas apenas de ter argumentos para criticar verdadeiramente o catolicismo, que eu ainda podia jurar ser um engano.
A primeiríssima coisa que fui estudar foi o entendimento da Igreja Católica sobre a Bíblia, e não poderia ser diferente, pois, como protestante à época, valia-me unicamente do que estava escrito na Bíblia por crer na Sola Scriptura. Fui ao blogue do Fábio (que foi fundamental para meus estudos nesse período), procurar um artigo do Dave Armstrong que trata justamente sobre as refutações dessa Sola. Quando vi que seriam “rápidas” refutações, como bom brasileiro que sou, não resisti e logo abri, na esperança de encontrar lacunas para sentir o gostinho de uma futura crítica e objeções a essas insolentes refutações.
O único gosto que senti, de verdade, foi do espanto. Li e reli diversas vezes, perplexo, aquele simples e rápido artigo de que, para minha infelicidade momentânea, eu não tinha como discordar. Discordar apenas por ir de encontro ao que eu cria ser o correto seria uma grave ofensa à minha inteligência. É como dizem por aí: a ficha caiu. Se o princípio basilar do protestantismo se desmancha, não faziam mais sentido as razões da minha fé. Irei transcrever uma publicação do Fábio no Facebook que é esclarecedora:
“O ‘Sola Scriptura’ é verdadeiro se, e somente se, for falso! O princípio é paradoxal em si mesmo porque necessariamente a Igreja tem de ter sido infalível, pelo o menos, quando reconheceu quais livros faziam parte da Bíblia. Se a Igreja tiver sido infalível, no mínimo, ao fazer isso, a própria Bíblia já não pode ser a única regra para normas de fé e prática.
Se você não aceita essa infalibilidade da Igreja em nenhuma circunstância, nem mesmo no reconhecimento do cânone bíblico, o “Sola Scriptura” é falso pela simples razão de não existir nenhuma maneira empírica de você saber qual é a Escritura a ser usada como única regra. Se você pontificar alguns critérios da sua cabeça, você já será uma autoridade superior à Bíblia pelo fato de esses critérios não constarem nela” – 15 de novembro de 2017.
Mais claro que isso, creio ser impossível. Na Bíblia, não encontraremos um só princípio que indique como ela deve ser composta. Simples: é necessário que haja uma autoridade constituída por Deus para separar o joio do trigo. Essa autoridade é a própria Igreja Católica. Isso ficou claro em questão de dias. Aliás, é incrível como os protestantes atestam a autoridade da Igreja Católica sem perceberem isso. Certa vez, minha mãe, que muito se afligiu com minha decisão, disse, emocionada e com lágrimas nos olhos, que cria apenas na Palavra de Deus. Eu, por pouco, não respondi o seguinte: “Dou Glórias a Deus porque a senhora crê. Eu também creio, afinal, foi a Santa Igreja Católica que selecionou cada livro escrito lá.”. Não falei para evitar conflitos, porém é um fato. Como já dizia o Pe. Paulo Ricardo, com outras palavras: “porque os protestantes aceitam o Novo Testamento inteiro, que foi selecionada pela Igreja, mas não aceitam a autoridade da Igreja?”. É, no mínimo, curioso.
Não sei se estou sendo suficientemente claro para trazer a imagem da minha aflição nesse relato, pois era exatamente esse o sentimento que tinha me tomado. Naquele momento de leitura, eram 15 anos de certezas que estavam indo ao chão. Minha fé estava em xeque, e eu, no fundo, não queria aceitar isso. Contudo, a Verdade é irresistível. Se eu simplesmente ignorasse esse fato por mera conveniência, não amaria a Verdade, por consequência não amaria a Cristo. Depois que meditei muito, ficou mais fácil assumir, para mim mesmo, que era necessária uma mudança. Não necessariamente uma migração para a Fé Católica, pois ainda tinha vários preconceitos… Mas permanecer no protestantismo já não fazia mais sentido.
Da leitura daquele artigo em diante, iniciou-se meu processo de conversão. Ficou até fácil compreender as demais coisas sobre a Igreja, já que não fiquei restrito ao que tinha na Bíblia – principalmente quando foi tratada, no artigo, a questão da Tradição, algo que fez, de imediato, todo o sentido, e que eu jamais havia estudado. Se a própria Bíblia diz que Nosso Senhor Jesus Cristo realizou muito mais do que era possível ser registrado, não é difícil crer que outras coisas, como a doutrina que deriva da Escritura, podiam não ter sido escritas, mas sim transmitidas oralmente aos Apóstolos. Note-se que, em momento algum, estou afirmando que a Bíblia não contenha a Verdade, mas sim que ela não abrange Sua totalidade.
Abrindo um parêntese: nesse momento, atentei também ao fato de que também desconhecia por completo a história dos cristãos que sucederam os apóstolos e que guardaram a Fé. Como a história de Bispo Irineu de Lyon, Bispo Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna e tantos outros. Isso me perturbou demais, pois me gabava de conhecer bastante a Bíblia, mas não tive a decência de procurar saber sobre os meus primeiros irmãos na Fé, só porque o nome deles não constava lá – ou pior: alguns até constam na Bíblia, e mesmo assim eu desconhecia sua história, como Lino, sucessor de Pedro. O máximo que sabia era de alguns pós-reformadores. Quantos relatos de Fé e de amor a Deus eu não perdi por desconhecer a história da Igreja primitiva? Diversos, com certeza.
Retornando à Tradição, fica evidente que os ensinamentos de Cristo eram transmitidos oralmente, dado que seria inviável passar tudo por escrito, pelo fato de não ter ocorrido até o século XVI o advento da imprensa. Já cogitou o trabalho colossal de transcrever milhares de Bíblias? Entendendo isso, percebe-se que o Sola Scriptura não faz sentido nem sob uma perspectiva histórica, já que seria impraticável até o século XVI, sem os meios técnicos necessários, a reprodução sistemática da Bíblia, sem falar que o povo era majoritariamente analfabeto. Como, antes do advento da Imprensa, cada cristão teria sua própria Bíblia para eventualmente consultá-la? Era a Igreja que devia transmitir os ensinamentos e manter-se fiel a eles. Sem mencionar que, no decurso de séculos, não havia a Bíblia como a conhecemos hoje. Parece que alguns protestantes acham que ela caiu “prontinha” do céu. Meu pai, ao se irritar com minha conversão, falou, diversas vezes, que a Igreja Católica escondia a Bíblia para que os fiéis não vissem a verdade. Mas era justamente o contrário, pois a Igreja sempre fez de tudo para preservar as Escrituras e a Doutrina que Cristo nos deixou, inclusive deixando muitos mártires²¹.
Eu, necessariamente, preciso crer que os ensinamentos permaneceram fiéis: afinal de contas, não faria sentido Nosso Senhor Jesus Cristo ter prometido que estaria com sua Igreja até a consumação dos séculos, sem que os seus servos guardassem os ensinamentos. Deus não mente! Considerando isso e tendo em mente que a Bíblia Sagrada não veio compilada do Céu, eu precisei aceitar também que aquela história que a Igreja tinha se corrompido era falaciosa (quando menciono a Igreja, não quero dizer, com isso, que não houve quem se corrompesse, são coisas completamente diferentes). Afinal, se ela tinha se corrompido, quem me garante que o cânon está correto, ou que a própria interpretação protestante não esteja viciada com essa corrupção milenar? Quem me garante, inclusive, que Lutero foi o responsável pelo retorno da “Igreja primitiva”, se ele cria em muitas doutrinas católicas que os protestantes hoje rejeitam? Onde está, na Bíblia, já que ela é suficiente para tudo, o aparecimento de Lutero? Se vier com uma interpretação do Apocalipse, pelo menos que seja unânime entre todos os protestantes, porque nem isso há. Se muito, encontra-se o advento de Lutero em II Timóteo 4,3. Por sinal, Eric Voegelin, intelectual protestante, afirma sobre a Reforma que “[…] deve-se descartar especialmente a noção de que a Igreja estava num estado particular de corrupção, ultrapassando tudo o que acontecera antes”. Mais uma vez, exponho as palavras do Professor Olavo de Carvalho: “querem que eu acredite que Deus enganou o mundo durante quinze séculos, até que veio Lutero e botou ordem na casa?”
Difícil, não é? Eu mesmo não acredito. Um parente, na intenção de me atingir, postou uma indireta numa rede social com uma frase de Lutero que dizia: “é melhor ser dividido pela verdade do que ser unido pelo erro”. Que raios de verdade bíblica é essa que não aceita nem os livros que compõem a Bíblia? Além do mais, as consequências dessa divisão foram as piores possíveis, sob várias perspectivas. Entre elas, o sangue de muitos católicos derramado. Sobre Lutero e a Reforma, acredito que já basta.
Tudo o que apresentei e indaguei até aqui constitui, digamos, a parte fácil da minha conversão. Por ter passado tantos anos no protestantismo, era extremamente difícil, para mim, aceitar algumas coisas no catolicismo. Superar meus preconceitos sobre a suposta adoração à Maria e culto a ídolos, por exemplo, foi trabalhoso. Incutiram muito bem essa falácia e, ademais, propaguei-a muito. Lembro-me, ainda, de que estava na casa de um amigo conversando sobre o cristianismo com ele e mais um colega nosso que é Católico, cujo nome é Jefferson. Eu e meu amigo simplesmente o bombardeamos com acusações e humilhações, covardemente, pois ele estava em desvantagem numérica. Dizia eu que não adiantava de nada ele se dizer cristão e ser um “adorador de Maria” entre outras acusações clichês. Agora, nesse relato, peço perdão a esse meu irmão, porque, só agora, compreendi que era órfão de Mãe.
Acerca da questão Mariana, li o máximo que pude e só então pude perceber que fazia todo o sentido essa honra especial prestada à Nova Eva e de sua importância. Assim foi também com o “culto aos ídolos”. Interessante, nessa questão, foi saber que até um dos maiores filósofos teístas ainda vivo, William Lane Craig, que é protestante, afirma que os católicos não são idólatras. É até simples de entender a visão Católica desse ponto: há uma separação clara entre a adoração, que é única e exclusivamente prestada a Deus; a veneração, uma honra especial dada à Maria pela sua relevância clara; e a honra, que é dada aos Santos da Igreja. Aprendido isso, cai mais um mito. Depois de aprender essa distinção e entendido que existe, sim, a possibilidade de homens de Deus serem verdadeiramente Santos, busquei entender a intercessão que é feita a eles e as orações pelos mortos no purgatório. Informando-me sobre essas questões, vi que havia passagens na Bíblia que eu nunca havia notado e que justificavam toda a Doutrina Católica.
Que dizer, todos os meus preconceitos tinham caído por terra. Já se tinha tornado suficientemente claro que a Verdade está na Santa Igreja Católica, e eu tinha que tomar uma decisão. Decisão brusca, mas certeira. Entretanto, nem tudo são flores. Como disse, cresci em ambiente protestante e mudar dessa maneira não estava nos meus planos. Eu tinha certeza absoluta de que não teria (e não tenho) o apoio dos meus pais, que talvez poderia perder muitas amizades, entre outras consequências. Para se ter ideia da tensão em que me encontrava, meu pai, que é muito enfermo devido à diabetes, estava com cirurgia marcada para tentar recuperar sua visão. Essa cirurgia requer total repouso e, obviamente, ele não podia ter contrariedades para não ter nenhuma complicação suplementar. Tentei ao máximo não contar aos meus pais e amigos por questões óbvias: se contasse, provavelmente iriam querer me convencer de que eu estava indo para a direção errada e essa informação poderia atrapalhar todo o processo de recuperação da cirurgia do meu genitor, trazendo aflição e tristeza (graças ao Bom Deus, ele já está ciente e, apesar de muito triste, isso não tem afetado gravemente sua saúde e recuperação).
Como se não bastasse, estava num relacionamento com uma jovem da minha antiga igreja. Era um relacionamento extremamente harmonioso e saudável, com uma pessoa maravilhosa, que eu amava e de quem não tinho uma queixa sequer. Deus é testemunha do que digo. Dito isso, não é difícil imaginar a dor que sentia só de pensar em ter que dizer que estava me tornando católico. Lembro-me das várias madrugadas que passei chorando, por imaginar tal situação e suas consequências. Porque, obviamente, a partir do momento em que firmasse essa decisão, não poderia continuar esse relacionamento por causa do jugo desigual. Quem acha isso uma besteira ou uma insignificância é por não levar a sério sua fé e não ter a capacidade de vislumbrar que a formação de uma família (que é e deve ser sempre o intuito de um namoro) seria conflituosa. Imaginem, tão somente, como seria problemático querer ensinar os preceitos católicos e levar meus filhos à Missa, enquanto minha esposa divergiria de mim, ensinando coisas contrárias à minha fé e querendo que eles frequentassem uma igreja protestante. É, no mais brando dos casos, complicado.
Tomei a atitude de contar para ela, a primeira que soube sobre minha conversão. O que era justo, visto que era minha companheira e amiga mais íntima. A princípio, ela não conseguiu entender as razões. Ela me pediu, então, que eu visitasse uma Igreja Católica e participasse da Missa antes de tomar qualquer decisão sobre o relacionamento, para saber se era realmente aquilo que queria para mim. Acredito que ela tinha esperanças de que me sentisse mal diante das coisas que veria lá. Foi então que pedi sugestões de Igrejas que eu poderia frequentar ao meu querido amigo Nando Castro, a quem sou muito grato por ter sugerido que fosse à Igreja Nossa Senhora da Soledade, próximo ao bairro da Boa Vista.
No dia 29 de Outubro, fui, pela primeira vez, a uma Missa, depois de 15 anos. Não me recordo de outro dia tão feliz como aquele. Além da beleza visível da Igreja, a beleza da liturgia (que eu havia estudado um pouco, para não ir sem saber absolutamente nada sobre o rito), dos hinos, da mensagem trazida e, principalmente, do momento da comunhão e da Eucaristia foram, para mim, sublimes. Emocionei-me fortemente, pois, pela primeira vez na vida, estava contemplando não uma ceia representativa ou simbólica, mas a Presença Real, carnal, de Nosso Senhor Jesus Cristo. Eu estava preenchido de uma felicidade inexplicável. Ainda que não tivesse participado da Missa em sua plenitude, pois não podia comungar, eu me senti completo. Era aquilo. Eu não tinha mais dúvidas: daquele dia em diante, abraçaria a Fé Católica independente de qualquer circunstância. Assim foi.
Conversei com minha ex-companheira sobre minha decisão, e terminamos. Claro que não é por ter certeza da minha escolha que tomar essa atitude tenha sido fácil: foi extremamente doloroso. Porém, dou graças a Deus todos os dias pela bondade dela, que me apoiou e orou muito pela minha vida. A ajuda e amizade dela foram essenciais para enfrentar os dias que viriam.
Após isso, segui estudando o quanto podia o catolicismo e pretendo continuar estudando, além de viver a Fé Católica. Mas, nesse intervalo diminuto de tempo, já ouvi coisas absurdas pelo fato de ter tomado essa decisão. Já ouvi de pessoas queridas que estou sendo conduzido pelo “adversário” (Satanás) nesse processo. Ouvi que Filosofia só faz confundir a mente do homem, como se não houvessem existido filósofos cristãos e filosofia cristã. Ouvi que Olavo de Carvalho é o Anticristo (sim, exatamente isso: pode rir a vontade também). Ouvi que estudar muito tira a pessoa da presença de Deus e a enlouquece. Essas foram as mais marcantes, mas tiveram outras mais.
Nessa nova jornada que tenho trilhado, acreditava que iria sofrer com muita solidão. Contudo, Deus é tão Misericordioso, que não permitiu que me sentisse só um único segundo. Além de Sua companhia maravilhosa, presenteou-me com amizades católicas formidáveis, que estão me ajudando nessa volta para Casa. Além do auxílio evidente do Fábio, tenho que agradecer em especial ao André Andrade, meu amigo, por ser um instrutor excelente nas reuniões sobre o Curso On-line de Filosofia (COF) e por me ter dado acesso a diversas aulas do Pe. Paulo Ricardo, essenciais para desfazer muitas dúvidas; ao Pablo Torres, pelo apoio espiritual e companheirismo; ao Nando Castro, pela sugestão maravilhosa; à Clara Gouveia, meu alento diário; à Daniela Gouveia, por ser uma segunda mãe para mim; à Letícia de Paula, que muito me aconselhou e me apoiou; ao meu amigo potiguar Gregório, que, mesmo sem que eu pedisse, rezou e reza muito pela minha vida e pela minha família, e a todos os meus amigos da Confraria de estudos em Pernambuco.
Também gostaria de agradecer ao Padre Paulo Ricardo, homem de Deus, que muito me ensinou; à página O Fiel Católico, por seus conteúdos excelentes: ao Dave Armstrong, que Deus continue o abençoando, e, por fim, ao Professor Olavo de Carvalho, por me ter deixado um pouco mais inteligente para perceber a Realidade. Há tantos outros que poderiam ser mencionados, tanto pela ajuda direta, como tão somente pelo bom testemunho, mas, a esses mencionados, eu sou grato de forma especial e estarão sempre em minhas orações.
Por fim, quero deixar claro que o que expus aqui não é a totalidade da Fé Católica. Longe de querer esgotar tão rica e coerente doutrina num simples relato: o Catolicismo é muito mais. Apenas quis tratar, resumidamente, como se deu minha experiência, que creio, devotamente, ter sido fruto de uma operação Divina. E o que aprendi foi suficiente para ter certeza de que estou no caminho certo, vivendo a Verdade, visto que estou em pleno gozo de minhas faculdades mentais para perceber isso. Atesto, então, para todos que lerem esse meu relato, que minha Fé, de hoje em diante, é a mesma do credo Católico:
Creio em Deus Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra; e em Jesus Cristo, seu único Filho, Nosso Senhor; que foi concebido pelo poder do Espírito Santo; nasceu na Virgem Maria, padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado morto e sepultado; desceu à mansão dos mortos; ressuscitou ao terceiro dia; subiu aos céus, está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os vivos e os mortos; creio no Espírito Santo, na santa Igreja Católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne, na vida eterna. Amém.
Paulo Henrique Gondim Sobral