O Real Motivo das Conversões ao Catolicismo
Nos últimos dias, um assunto digamos inusitado e ainda desconhecido do público
mais amplo voltou a ser destaque nas redes sociais protestantes: a conversão de
evangélicos ao catolicismo. De fato, é um tema que ainda precisa ser digerido bem tanto do lado protestante quanto do lado católico. Alguém que viveu entre os anos de 1980 e 2010 — quando ocorreu uma migração em massa de católicos para comunidades evangélicas — jamais pensaria que um fenômeno dessa natureza seria possível. Mas hoje, eu gostaria de dar a minha humilde opinião sobre uma coisa que, até agora, não vi ninguém falar.
Muitos discutem o motivo dessas conversões. Recentemente, um comentário do
pastor batista Yago Martins incitou acidentalmente uma guerra entre batistas e
presbiterianos, já que o mesmo disse que “todos os meus amigos presbiterianos que davam mais atenção às confissões de fé e às interpretações de Calvino do que para a teologia bíblia e [a] Palavra de Deus acabaram por virar católico-romanos.” Bem, nós do Apostolado Cardeal Newman podemos confirmar que sim, a maioria dos que se convertem ao catolicismo vêm da Igreja Presbiteriana, mas eu não diria que esse é um motivo tão forte para você tomar uma decisão que compromete tantas áreas da vida assim. Mudar de credo envolve deixar família, amigos, emprego, prestígio e muito mais.
Outros fortes candidatos a principal razão dessas conversões, segundo algumas
opiniões que conseguimos observar desde o último ano, seriam a doutrina católica sobre anticoncepcionais, os recentes movimentos políticos e o professor Olavo de Carvalho, e outros. Mas de novo, isso simplesmente não atinge o cerne da questão. Eu gostaria de oferecer a opinião de quem está do lado de cá. Sou católico há 4 anos e meio, e já vi vários processos de conversão de perto. Hoje, eu não pretendo dar motivos teológicos, doutrinários ou até mesmo pessoais — pergunte aos próprios convertidos, pois os seus testemunhos já estão publicados em muitos lugares, inclusive nas nossas plataformas.
E sem mais delongas, o real motivo pelo qual os protestantes se convertem ao
catolicismo é:
Não se põe pano novo em roupa velha.
No capítulo 9 do Evangelho de Mateus, versículo 16, Jesus diz que “ninguém põe um
remendo de pano novo numa veste velha, porque arrancaria uma parte da veste e o rasgão ficaria pior.” Da minha parte, eu nunca tinha prestado muita atenção nestas palavras de Jesus. Todo mundo lembra mais do vinho novo e dos odres velhos, mas nesse caso, o remendo de pano novo em roupa velha é a ilustração perfeita da real motivação de todas — sim, ouso afirmar, todas!—as conversões de protestantes ao catolicismo.
Mas para isso, eu preciso de provas. E não de qualquer prova, mas de uma prova que
já se sustenta por si só. Uma das maiores provas da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo é que as suas testemunhas nunca negaram o fato, mesmo sofrendo penas terríveis por conta disso. Até mesmo os homens mais poderosos do mundo não conseguem sustentar mentiras por muito tempo — como o escândalo do Watergate, que envolveu o presidente dos EUA Richard Nixon, nos anos 70. Então, precisamos de um fato concreto que envolva muitas pessoas, e que já tenha ocasionado um efeito em muitas pessoas.
No caso das conversões de protestantes ao catolicismo, temos uma prova desta
natureza: o Movimento de Oxford e as suas consequências, na Inglaterra vitoriana (séc. XIX). Deste movimento, fez parte o nosso padroeiro, o Cardeal Newman. Você pode ler mais sobre o Movimento de Oxford, em um texto que já publicamos, clicando aqui. E é desse mesmo texto que eu quero falar.
O Movimento de Oxford foi um movimento de intelectuais anglicanos da
Universidade de Oxford em defesa do anglo-catolicismo da Alta Igreja anglicana, em uma época onde ser anglicano era mais algo burocrático do que espiritual. Como anglo-católicos, os “tractarianistas” (como ficaram conhecidos) publicavam suas ideias em folhetos (“tracts”, ou tratados). Em resumo, eles defendiam que o Anglicanismo, no cerne da sua identidade, era mais católico do que protestante (lembremos que a Igreja Anglicana está em uma “via média”, ainda retendo muitos elementos do seu período pré-Reforma). Em seu último tratado, o n°90, que foi escrito pelo próprio Cardeal Newman, o Movimento reafirmou isso mais uma vez discorrendo sobre os 39 Artigos. Mas o resultado foi desastroso… para os seus adversários.
A acusação de que o Movimento era “romanista” agora tinha mais fundamento do
que nunca, e as autoridades anglicanas até tentaram censurar o n°90. Isso não aconteceu, mas aquele foi o último dos tratados. Após isso, uma série de eventos aconteceu e muitos dos próprios tractarianistas, além de muitos outros anglicanos, se converteram ao catolicismo romano a partir de 1841. Nove anos depois, a Igreja Católica voltou a ter uma hierarquia no país, restabelecendo as dioceses católicas sobre a Arquidiocese de Westminster — cujo segundo arcebispo foi um tractarianista, o Cardeal Edward Manning.
Na minha opinião, existe um padrão que remonta ao princípio do pano novo em
roupa velha, e este padrão se aplica a todo caso de conversão ao protestantismo, em
alguma escala. As ideias de Newman e de seus companheiros estavam sim ligadas às raízes do anglicanismo, e o próprio Newman lançou palavras muito graves contra a Igreja Católica anos antes de se converter (das quais ele fez questão de se retratar). Mas tinha um problema, óbvio: aquelas ideias eram “católicas demais”. Não católicas no sentido universal, mas católicas no sentido romano: aquilo era romanismo demais para um protestante aguentar.
O sentimento de Newman pode ser ilustrado nas palavras de um convertido do séc.
XXI, também anglicano: o ex-capelão da Rainha, Gavin Ashenden. Ao deixar a Igreja
Anglicana (inicialmente para juntar-se a um grupo do realignment ou continuísmo
anglicano, depois à Igreja Católica), ele disse que simplesmente preferia estar em um lugar onde pudesse desempenhar um papel mais criativo do que ser apenas uma pedra no sapato dos outros. O Movimento de Oxford era isso: uma fonte contínua de irritação para os demais. Assim que ele foi condenado em “última instância” na opinião popular, nem seria necessário formalizar nada para expulsar os seus membros — eles já não pertenciam ali há muito tempo. Nas palavras de Newman: “não houveram conversões a Roma, até que o n° 90 foi condenado.”
Podemos aplicar isso agora ao caso da semana: o presbiterianismo. E para isso, eu só
preciso tocar em um aspecto que divide os presbiterianos e os batistas — o batismo de crianças, ou pedobatismo. Se você falar para um evangélico do interior da Paraíba (meu estado) sobre batizar crianças, ele vai dizer que isso é coisa de católico. E foi exatamente isso que me relatou o pastor da IPB da minha cidade, quando eu perguntei a ele sobre o assunto. Mas, se você for consultar os dados históricos, o batismo de crianças está na raiz da Reforma Protestante: os grupos batistas vieram depois, e os anabatistas foram condenados. Mas de novo: isso é coisa de católico.
Coisa de católico vai, coisa de católico vem, o fiel protestante que decide adotar
ideias consideradas “católicas demais” pela maioria (como o batismo de crianças, ou a abertura à vida, ou uma visão mais litúrgica do culto da igreja, enfim) será rechaçado pelos demais e perderá cada vez mais espaço dentro do seu círculo. Ninguém aguenta ser um estranho em sua própria casa, a menos que ali não seja mais a sua casa. Nessa hora, o fiel vai começar a olhar para o outro lado do rio Tibre (o rio que corta a cidade de Roma) e ver que, talvez, as coisas sejam um pouco diferentes. E aí, o processo é natural, como cruzar um rio.
Como dizem os mais jovens, é sobre isso: os protestantes se convertem porque não
aguentam ser um pano novo — e de fato novo, porque como diz Newman, a verdade é sempre nova e viva, enquanto as heresias nada têm de novo e já estão em um processo de morte lenta — repuxado pela roupa velha e sem criatividade do protestantismo, que cada vez mais vai se distanciando das suas raízes e se tornando algo que, no fundo, ninguém queria que ele fosse, quando tudo começou. Claro que o presbiterianismo tinha que levar esse destaque no Brasil: foram os calvinistas que começaram essa “segunda Reforma” (lema que o Movimento de Oxford também usou!), e o presbiterianismo tem todos os aspectos internos que fazem dele a incubadora perfeita para futuros católicos: um apelo de “retorno às raízes” e a acusação de serem católicos demais.
Aos meus irmãos protestantes, eu deixo um simples recado: quanto mais vocês
reclamam, quanto mais vocês esboçam aos quatro ventos todo o ódio e repulsa que sentem pelo catolicismo romano, mais pessoas vão se converter. Vendo isso, eles verão que são estranhos em sua própria casa, e verão que o melhor modo de serem fiéis a todos os princípios que eles aprenderam enquanto protestantes é fazendo o mais impensável e o mais absurdo: ser católico romano. Não porque leram Calvino demais, não porque eram alunos do Olavo de Carvalho, mas simplesmente porque estão de saco cheio dos próprios protestantes.
Por que os protestantes se convertem? O Apostolado Cardeal Newman diz: porque
não se põe pano novo em roupa velha!