Como o estudo da fé católica me levou ao catolicismo João Marcos

AGRADECIMENTOS:

A Deus;

À minha família;

À Mônica, minha eterna namorada e esposa;

Ao Padre Ricardo de Barros Marques, da diocese de Santos; 

Ao Gustavo Santos, meu padrinho de casamento e padrinho do meu primogênito

Ao Natan Oliveira, do Rio,  o primeiro a dizer que um dia eu seria católico,

Ao Gustavo Siqueira, por ser meu catequista e amigo,

Ao Fábio Salgado de Carvalho, pelo testemunho brilhante da sua conversão, e pelo apostolado brilhante em seu perfil do Facebook,

Aos ateus da Internet (em especial o Camilo Caetano), que me levaram a estudar a Idade Média e conhecer a Igreja Católica,

A todos que me mostraram quão pouco eu sabia.

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Não existem cem pessoas que odeiam a Igreja Católica, mas existem milhões que odeiam aquilo que pensam ser a Igreja Católica. 

(Venerável Arcebispo Fulton Sheen)

É impossível ser justo com a Igreja Católica. No momento em que o homem cessa de atacá-la, ele sente uma atração em direção a ela. No momento em que ele cessa de gritar, ele começa a ouvi-la com prazer. No momento em que ele tenta ser justo ele começa a admirá-la.” 

(G. K. Chesterton)

Este é o relato dos motivos da minha conversão ao Catolicismo. Não é um tratado de Teologia nem uma tentativa de converter alguém. Escrevi este relato para responder quando perguntarem os motivos da minha conversão. No decorrer do texto indiquei vários livros ao leitor interessado em compreender os motivos que me levaram a tomar a decisão de seguir a Igreja Católica Apostólica Romana. Ao final do texto eu proponho um roteiro de leituras para entender a fé católica e examinar as acusações que fazem à Igreja.

AVISO: Peço que leia os livros recomendados, em especial aqueles destacados em negrito, antes de tentar rebater as palavras aqui escritas. Não voltei para a Igreja por capricho ou comodismo; essa decisão custou muito esforço, oração e alguns sacrifícios. Ou como disse um polêmico brasileiro: “Eu acho que o direito de ter opinião é proporcional ao interesse sincero que você tem pelo assunto. Se você não tem interesse pelo assunto para você sequer ler alguma coisa, por que nós devemos ter interesse de ouvir a sua opinião?

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O Início

Sempre fui cristão. Fui batizado na Igreja Católica quando era um bebê. Por volta dos meus 06 anos, eu e minha família fomos para a igreja batista (não denominacional). Desde então, minha família frequentou várias denominações (principalmente batista não denominacional e presbiteriana) e nunca mais tivemos contato com o Catolicismo. 

Tudo o que eu sabia sobre a fé católica era o que diziam seus críticos em nossas igrejas: os católicos não eram cristãos, pois adoravam os santos e Maria, não unicamente a Deus; obedeciam homens (o Papa) e ignoravam a Bíblia em muitas das suas práticas. Tanto é verdade que muitas “missões” das igrejas a que pertencíamos aconteciam em países católicos. Pessoalmente, eu também pensava que a fé deles devia ser fraca mesmo, pois eu desconhecia qualquer católico que levasse uma vida diferente daqueles “do mundo”, ao contrário de vários irmãos batistas e presbiterianos. Havia uma intenção sincera de converter-se, de viver como cristão (ainda que nós não soubéssemos com certeza o que deveria ser isso – tínhamos apenas nossa interpretação pessoal do Evangelho).

Tive a sorte de ser muito bem ensinado nas Escrituras pela minha mãe. Ela me ensinou o gosto pela leitura, e por isso sempre gostei de estudar. Estranho, porém, é que meu interesse não se aplicava à religião: a fé da nossa família era tão presente que eu pensava ser ela um fato incontestável, algo óbvio. Por isso não havia dúvida que me levasse a estudá-la a fundo. 

A Idade das Trevas

Quando criei meu perfil no Facebook não demorei em me envolver em discussões com ateus. Logo apareceu o famoso argumento da Idade das Trevas: durante o período de mil anos entre 500-1500 a Igreja Católica oprimiu o Ocidente através do misticismo e da ocultação do conhecimento, além de perseguir oponentes por meio da Inquisição. Isto bastava para comprovar que a religião, especialmente o Cristianismo, está na contramão do progresso, da ciência e da liberdade individual.

Sendo cristão é meu dever conhecer e testemunhar a verdade. Então comecei a estudar a tal Idade das Trevas para verificar se a Igreja foi responsável por tamanha crueldade. Pobre de mim! Descobri que aconteceu exatamente o contrário: num milênio de caos, fragmentação política, invasões de povos selvagens e peste, a Igreja foi a única instituição ocidental a manter-se estável, um verdadeiro porto seguro. O conhecimento da época dos gregos e romanos foi preservado através de muito trabalho dos clérigos católicos, como por exemplo os monges copistas, responsáveis por copiar livros inteiros à mão. Em vez de combater a ciência, a Igreja foi por muitos séculos a única instituição a fomentar o desenvolvimento científico na Europa. Ela foi a criadora das universidades, seus monges traduziram muitas obras da época romana e grega, além de permitir que debates acalorados com pensadores de outras culturas acontecessem dentro das suas universidades.

Quanto à famosa Inquisição minha surpresa foi ainda maior: aproximadamente 2.000 pessoas foram condenadas à morte pelos Tribunais da Inquisição medievais (1231-1400 dC). Durante as inquisições da Espanha e Portugal, as mais violentas, 6.000 pessoas morreram nos 500 anos de duração dos tribunais eclesiásticos ibéricos. Considerando a população ibérica e europeia nos níveis da Idade Média, temos que a pior inquisição, a de Portugal e Espanha, condenou à morte 17 pessoas a cada 100 mil habitantes, por ano. A inquisição medieval, mais branda, condenou à morte 0,08 pessoa a cada 100 mil habitantes, por ano.  Só para comparar, no Brasil 22 a cada 100 mil habitantes morreram em acidentes de trânsito e 2,55 pessoas a cada 100 mil habitantes morreram por afogamento. 

O historiador protestante Phillip Schaff afirma: “Para vergonha das igrejas protestantes, a intolerância religiosa e até a condenação à morte continuaram muito tempo depois da Reforma. Em Genebra esta perniciosa teoria foi posta em prática pelo estado e pela igreja, admitindo até mesmo o uso de tortura e do testemunho de crianças contra seus próprios pais, com a autorização de Calvino. Bullinger, na Segunda Confissão Helvética, anunciou o princípio pelo qual a heresia poderia ser punida como os crimes de assassinato ou traição.” 

Não se trata da tática de justificar um erro apontando o erro dos outros. Tortura é inaceitável sob qualquer ponto de vista. No entanto, devemos ser justos e agir com a mesma rigidez no caso dos morticínios realizados por outros grupos, como os protestantes (os Anabatistas de Muntzer), islâmicos e ateus – durante a Revolução Francesa, que nos ensinam ter sido fundamentada nos princípios de “Igualdade, Liberdade e Fraternidade”, foram mortas 140 mil pessoas em cinco anos. Quer dizer, uma revolução de cunho ateu matou 05 vezes mais gente, proporcionalmente, do que a pior inquisição.

Para encerrar este assunto, a própria Igreja admitiu os abusos cometidos na Inquisição. Tanto que ela abriu os arquivos da Inquisição a um grupo de 30 historiadores reconhecidos internacionalmente, para que eles investigassem os fatos.

Estudando a Fé

Este estudo sobre o papel essencial da Igreja Católica na Idade Média fez com que eu a admirasse. Mas isso era só o começo.

No início de 2015 decidi então conhecer a fé católica. Se o papel histórico da Igreja Católica na Idade Média foi muito diferente do que me ensinaram, será que a fé católica não me surpreenderia também? Afinal, o julgamento justo é aquele emitido quando o juiz conhece as razões de todos da disputa. Eu não conhecia a fé católica. Como poderia julgá-la?

Comecei por livros que explicam a fé católica ao leitor protestante. Foram estes: 

  • Catholicism for Protestants – Shane Shaetzel;
  • Todos os Caminhos levam a Roma – Scott e Kimberly Hahn
  • Born Fundamentalist. Born Again Catholic – David Currie; 
  • A Fé Explicada – Pe. Leo J. Trese. 

Quem quer conhecer a fé católica e as respostas às acusações dos evangélicos precisa ler esses livros. 

Da minha experiência pessoal, creio que o primeiro problema com o Catolicismo que aparece na mente evangélica é a veneração dos santos e de Maria. Naturalmente, foi o primeiro problema que procurei explicações dos católicos. O nome técnico é Intercessão dos Santos. Por que o católico reza a Maria e aos santos? Isso não é idolatria? Católico nenhum leu Êxodo 20, onde Deus proíbe fazer imagens de escultura?

Não é idolatria. O católico não considera a oração uma forma de adoração. Da mesma forma que pedimos oração a outros irmãos da igreja, o católico pede oração a pessoas que viveram vidas extraordinárias aqui e que estão vivas no Céu, diante de Deus. 

Especificamente no caso de Maria, a mãe de Deus, creio que grande parte do problema protestante se resolve ao compreender como os católicos entendem a Intercessão dos Santos. Temos então o seguinte raciocínio:

1) A oração dos santos é mais eficaz porque eles estão em plena comunhão com Deus, no Céu.

2) Maria é a mais santa dentre todos os santos, pois não teve pecado original. Além disso, tem ligação íntima com Cristo, a ligação entre mãe e filho.

3) Logo (aceitas as premissas 01 e 02), é razoável pedir que Maria interceda por mim diante de Cristo.

(Para não falar que os primeiros cristãos já reverenciavam Maria )

Ao entender isto, fica fácil entender também porque os católicos devotam tantas orações e cerimônias aos santos em geral e à Maria em particular. Eles não acreditam que os santos são deuses e sim que os santos, hoje no Céu, são excelentes intercessores dos simples cristãos que estão aqui. Recomendo ler o que ensina oficialmente a Igreja a respeito de Maria.

O último conceito que é útil estudar para entender os católicos neste assunto dos santos é a diferença entre adoração e veneração. Adoração é o culto prestado unicamente a Deus, reconhecendo-o como Deus Único, Onipotente, Criador de tudo que existe. O católico só presta esse tipo de reconhecimento a Deus. Já a veneração é uma forma de prestar homenagem, uma demonstração pública de respeito. Da mesma que homenageamos grandes personalidades políticas, artísticas ou dos negócios, o católico homenageia, dentro do contexto cristão, aqueles que viveram vidas exemplares. 

A Igreja tem 2 mil anos de idade e já estudou profundamente os Mandamentos de Moisés, incluindo os dois primeiros (sobre a idolatria e imagens).

Então, se não podemos venerar os santos e encomendar-lhes orações, então é muito menos homenagear qualquer pessoa desta terra, ou pedir que algum irmão ore por mim. Se os santos, que viveram unicamente para Cristo, são indignos de homenagem, quão dignos seremos nós, meros mortais que não conseguem passar 01 dia se sacrificando por Deus?

Então, os católicos veneram os santos, isto é, homenageiam e pedem oração a eles. Homenagem e oração são atos que fazemos com outras pessoas, bem mais pecadoras que qualquer santo. Por que não fazer o mesmo a eles?

Alguns dizem que essa veneração aos santos  diminui a glória devida a Deus. De forma alguma! Os santos só puderam ser santos por causa da graça de Deus. Seu único mérito foi responder ao chamado divino de forma mais perfeita. Ou seja, a glória dos santos é a glória de Deus.

Existem muitos bons livros dedicados a explicar a devoção mariana, seu surgimento e desenvolvimento na História e porque ela não é uma forma de idolatria. Em português não temos muita opção além do excelente Salve Santa Rainha – Scott Hahn

Do motivo de não continuar protestante

Entender essas práticas católicas serviria apenas para desmistificar minha visão do catolicismo. Eu já começava a ser justo com a Igreja. No entanto, somente quando estudei 02 assuntos que não costumam ocupar o primeiro lugar na lista de problemas católicos, é que fiquei numa posição insustentável, levando-me a tomar a decisão sobre minha fé.

O principal fundamento teológico do Protestantismo, isto é, de todas as denominações cristãs não-católicas que surgiram a partir do ano 1500 é o Sola Scriptura. Este princípio ensina que “somente a Escritura é a suprema autoridade em matéria de vida e doutrina; só ela é o árbitro de todas as controvérsias. É ele que justifica a famosa pergunta dos evangélicos “onde isso está na Bíblia?” Esta é a pergunta que os católicos mais escutam dos protestantes.

O grande problema com o Sola Scriptura é que ele não é bíblico. O “Só vale o que está na Bíblianão está na Bíblia. Não precisa acreditar em mim. Procure na Bíblia. Pergunte a qualquer teólogo protestante em qual parte da Bíblia está o Sola Scriptura. Ele não saberá responder. O que me deixou mais chocado foi descobrir que o Sola Scriptura é simplesmente aceito um axioma, uma ideia que não precisa de provas (é irônico os protestantes acusarem os católicos de dogmáticos quando a base da crença protestante é o dogma sem fundamento). E isso não sou eu quem diz: “Existem evidências internas e externas da inspiração e divina autoridade das Escrituras, mas estes atributos não são passíveis de ‘prova’. A única evidência que importa é o “testemunho interno do Espírito” no coração do leitor. Ênfase de Calvino: ‘A menos que haja essa certeza [pelo testemunho do Espírito], que é maior e mais forte que qualquer juízo humano, será fútil defender a autoridade da Escritura através de argumentos, ou apoiá-la com o consenso da Igreja, ou fortalecê-la com outros auxílios. A menos que seja posto este fundamento, ela sempre permanecerá incerta’ (8.1.71). . Ou seja, a “prova” que uma interpretação particular da Bíblia é inspirada por Deus é uma “certeza maior e mais forte que qualquer juízo humano”. Basta se sentir certo para estar certo. Já pensou fazer isso num vestibular?

Tome a seguinte afirmação: “Não existe verdade”. Quando alguém afirma isso já se contradiz, porque essa mesma frase é em si mesma uma verdade. Na verdade, o que a pessoa quis dizer é: “Não existe verdade – exceto esta aqui”. É um princípio arbitrário, afinal, só é verdade porque quem o enuncia diz que é verdade. Um princípio falho em si mesmo não pode ser verdade. É o mesmo problema do Sola Scriptura.

A “prova” do Sola Scriptura é 2 Timóteo 3,16. Como ele é tão usado, vale a pena fazer alguns comentários sobre esta passagem. Ele diz: 

Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça;

Para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra.” (2 Timóteo 3:16-17)

Onde a passagem afirma que a Bíblia é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, etc? Em lugar nenhum. “Toda” é diferente de “”. Veja este exemplo:

Afirmação 1: Todo ser humano respira.

Afirmação 2: Só o ser humano respira.

Qual delas é verdadeira? Percebe a diferença provocada por uma única palavra? É “forçar a barra” enxergar nesses versículos a prova do Sola Scriptura, quando eles apenas dizem que a Bíblia é divinamente inspirada e útil para o ensino. Ora, os católicos também acreditam nisso! Essa passagem não anula a autoridade da Igreja e da Tradição por ela preservada. 

No mesmo capítulo Paulo cita uma tradição extra bíblica (vs. 8 – não há nenhuma referência a Janes e Jambres no Antigo Testamento) e exorta Timóteo para seguir a doutrina que ele lhe ensinou (vs. 10). Por acaso Paulo entregou uma Bíblia a ele? 

O Sola Scriptura não encontra fundamentação bíblica e também histórica. Os cristãos primitivos, aqueles que viveram até 300 anos depois de Cristo, nunca acreditaram no Sola Scriptura. Todos acreditavam na necessidade de existir uma autoridade central, outorgada pelo próprio Cristo, para interpretar as Escrituras. Um exemplo famoso (mas não o único) é Santo Agostinho, que disse: “Eu não acreditaria no Evangelho, se a isso não me levasse a autoridade da Igreja Católica

Essa falta de crença no Sola Scriptura pode ser explicada. Nos primeiros 300 anos de Cristianismo não existia Bíblia. O cânon, o conjunto dos livros cristãos que formam a Bíblia, só foi definido entre 367-405 dC. Durante todo esse período em que não existia uma Bíblia, qual foi a autoridade suprema dos cristãos em matéria de fé?  E pior: até a invenção da imprensa em 1455 pouquíssimos livros estavam em circulação, porque eram de difícil produção. Assim, a quem os cristãos podiam recorrer durante os 1400 anos em que não existia a imprensa?

Além disso, “pelos frutos os conhecereis”: hoje existem milhares de denominações protestantes , e cada uma delas alega possuir a “verdadeira interpretação” das Escrituras. Quem está falando a verdade? Qual é a verdadeira fé e a verdadeira igreja? Qual o modo correto de interpretar a Bíblia? O que vale pra hoje e o que não vale mais?  Quem afirma rejeitar a Tradição porque segue apenas a Bíblia não pode fazer isso, porque foi a própria Tradição católica quem escolheu quais livros pertencem ao Novo Testamento. Em lugar algum a Bíblia diz quais livros fazem parte dela. Então, o simples fato de ser “biblista” só é possível graças à Tradição católica.

A Bíblia não caiu do Céu. Durante quase 400 anos os cristãos lutaram para reconhecer, aos poucos, os livros inspirados, até que concílios católicos, compostos por bispos católicos, definiram os livros da Bíblia. Foi a autoridade da Igreja que encerrou a discussão sobre os livros inspirados.

Então, para encerrar este assunto, o Sola Scriptura: não é bíblico, não é lógico, não é histórico e teve consequências catastróficas para o Cristianismo. Foi um conceito inventado depois de 1500 anos de Cristianismo. Sendo assim, é questão de prudência considerar que a posição católica é razoável, pelo menos. Não estou pedindo para você se converter, apenas para reconhecer que não é absurdo a Palavra de Deus não se restringir a um livro. Isto é o mínimo que se espera de alguém honesto.

Por último: não pergunte “Onde isso está na Bíblia?”. Todo mundo afirma que é bíblico. A pergunta que importa é “Como eu descubro a interpretação correta da Bíblia? O eunuco etíope descobriu a resposta: através do ensino de mestres autorizados (Atos 8:31).

Ademais, o problema do Sola Scriptura é discutido exaustivamente por muitos autores católicos. O“só vale o que está na Bíblia” não surpreende os católicos.

Diante de tudo isso, eu não podia mais aceitar o fundamento do Protestantismo, o Sola Scriptura. A Bíblia sozinha não é suficiente para resolver todos os conflitos da vida cristã. Simplesmente havia coisas demais que eram “deduzidas” (eu prefiro dizer “inventadas”) numa época. Isso sem mencionar que a Bíblia é uma coleção de livros complexa demais para que um fiel comum, sem condições de estudar grego, latim, hebraico , aramaico, filosofia e teologia, pudesse interpretar de forma mais correta que o corpo de toda a Tradição cristã de 2 mil anos. Seria muita arrogância. Foi nesse momento que eu, pelo menos em consciência, deixei o Protestantismo.

Rome, Sweet Home

Faltava mais um motivo para me dar coragem de escolher a Igreja. Este motivo foi a Eucaristia.

A Eucaristia é o centro da fé católica. Com muita distância se parece com a “Santa Ceia” dos protestantes, porém muito mais carregada de sentido e importância: o católico acredita que na Eucaristia o pão e o vinho se transformam, milagrosamente, no corpo e no sangue de Cristo. Assim, podemos dizer com razão que o católico “absorve” o próprio Cristo, presente de maneira real na celebração da Eucaristia. Loucura? Canibalismo? Essas acusações não são novas.

No Evangelho de João, capítulo 06, o próprio Cristo profere estas palavras: “Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim.” (João 6:53-57). Logo em seguida, pela primeira vez em seu ministério, Jesus perde discípulos por causa de um ensinamento. Eles consideraram essas palavras de Jesus “muito duras” (vs 60).

A resposta de todo protestante é alegar que Jesus disse essas palavras no sentido figurado, isto é, comer a carne e beber Seu sangue seria um símbolo. O problema com essa versão é que ela faz de Jesus um insensível que gostava de induzir seus seguidores ao erro e à blasfêmia. Explico.

Em todo o Evangelho (nos 04 livros, Mateus, Marcos, Lucas e João) Jesus Cristo fez questão de explicar – pelo menos aos Seus discípulos – o significado de suas palavras quando falava por meio de parábolas. Veja no caso do “nascer de novo” com Nicodemos (João 3) e em todas as parábolas (semeador, joio e trigo, videira, talentos, etc). Jesus Cristo, sendo Deus, não pode induzir outros ao erro, ao pecado gravíssimo da blasfêmia. No entanto, justamente no caso da Eucaristia, Ele se calou. O único cenário que justifica Jesus permitir que vários dos seus discípulos O abandonassem é por ter dito exatamente o que Ele quis dizer. Não há forma mais clara de dizer que deveríamos beber Seu sangue e comer Sua carne.

Há também a evidência histórica: os primeiros sucessores dos apóstolos acreditavam que Jesus estava realmente presente no pão e no vinho da Ceia. É por isso que Paulo fez a famosa advertência em 1 Coríntios 11:29: “Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor.” É pecado grave participar da Ceia sem discernir (reconhecer) nela o corpo de Cristo.

Os protestantes insistem em dizer que a Ceia é apenas um memorial, uma cerimônia para lembrarmos de Cristo, e que consequentemente o pão e o vinho são símbolos de Cristo. No entanto, os primeiros cristãos relacionaram o Corpo de Cristo Eucarístico ao Corpo Crucificado Tornar o corpo de Cristo na Ceia simbólico é tornar a Crucificação simbólica.

Sabendo que o Cristo, capaz de sofrer uma morte cheia de torturas por nós, não seria capaz de perder discípulos por causa de uma confusão de palavras, eu não tenho motivos para acreditar em outra coisa que não seja o sentido literal das palavras de Jesus: que precisamos comer Sua carne e beber Seu sangue para ter vida em nós. E conhecendo que na Igreja Católica eu poderei participar do banquete do próprio Cristo, e que Ele, Deus encarnado, encontra-se fisicamente presente na Santa Missa, somente o orgulho obstinado poderia servir de motivo para não me render à Igreja Católica Apostólica Romana.

O que mais eu deveria fazer se soubesse que Jesus Cristo está fisicamente presente em algum lugar?

E eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos.” 

(Mateus 28:20)

Em Cristo Jesus Nosso Senhor,

João Marcos.

Olímpia, São Paulo, 28.07.2015

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Proponho um roteiro de leituras para entender o que ensina a Igreja Católica, e conhecer a “visão do outro lado” diante de tantas acusações (de idolatria até conspiração contra o progresso). Espero que estes livros sejam apenas o início das suas investigações para descobrir qual é a Igreja que Cristo fundou.

    1. Catecismo da Igreja Católica: esse é o “mapa” católico. Se você quer saber o que ensina a Igreja sobre determinada questão, consulte primeiro o Catecismo. É fonte confiável e oficial.
    2. Respondendo dúvidas protestantes: Em defesa da fé católica nas questões mais difíceis – Alessandro Lima (aqui). É um excelente material para começar a remover preconceitos sobre a Igreja.
      1. O Fábio Salgado colocou em seu blog uma lista de livros católicos antigos, em português,  sobre o Protestantismo. Todos os livros são gratuitos. Não se espante com a retórica dos livros. Naqueles tempos os dois lados eram agressivos. A lista está aqui: http://fabiosalgado.blogspot.com.br/2017/06/livros-catolicos-em-portugues-contra-o.html
  • Testemunhos de convertidos à Igreja Católica: eu sempre achei que só pessoas burras ou desonestas permaneceriam na Igreja Católica, imagine então converter-se a ela!. Estava redondamente enganado. E foi só depois que eu fiz o caminho reverso é que percebi como a grande maioria dos protestantes ainda pensa isso dos católicos. Espero que estes livros ajudem a desmistificar a noção que têm dos católicos. Todos os caminhos levam a Roma – Scott e Kimberly Hahn (aqui); Surprised by Truth: 11 Converts Give the Biblical and Historical Reasons for Becoming Catholic (aqui); Surprised by Truth 2: 15 Men and Women Give the Biblical and Historical Reasons For Becoming Catholic (aqui); Surprised by Truth 3: 10 More Converts Explain the Biblical and Historical Reasons for Becoming Catholic (aqui), autoria do Patrick Madrid; o testemunho brilhante da conversão do Fábio Salgado à Igreja (aqui); o testemunho do Paulo Gondim, oficial da Cavalaria; Lista de ex-protestantes conversos ao Catolicismo com livros publicados; Todos os membros da Igreja Cristã Maranatha (Detroit) se convertem ao Catolicismo (aqui);. Com esses testemunhos espero que o leitor entenda que pessoas com motivos sérios, fundamentados, e com uma prática de vida piedosa, escolheram a Igreja Católica. Não é uma escolha por conveniência, malícia ou ignorância. Muitas dessas pessoas perderam amigos, familiares e todo seu círculo social de uma vida inteira quando escolheram a fé católica. Todos eram cristãos estudiosos, inteligentes, conhecedores da Bíblia e ativos na vida ministerial das suas igrejas. Se meu exemplo não basta, espero então que o exemplo destes irmãos em Cristo o ajude a perceber que a fé católica não é uma mentira ou tradição de homens.
  • Católicos que mudaram de vida: uma das perguntas que me fizeram é porque é tão difícil ver um católico que muda de vida. Bom, quando estudamos Arquitetura ou Engenharia Civil não começamos pelos prédios que caíram, mas por aqueles que estão firmes até hoje. O mesmo vale para o estudo dos católicos: estuda-se primeiro aqueles que viveram a fé de forma mais perfeita e correta. Estes são os santos. Leia algumas biografias dos santos como: Saints Behaving Badly: The Cutthroats, Crooks, Trollops, Con Men, and Devil-Worshippers Who Became Saints – Thomas Craughwell (aqui); Os Santos que Abalaram o Mundo – Rene Fullop Miler (aqui); Padre Pio – Um Santo entre Nós – Renzo Allegri (aqui); História de uma Alma – autobiografia de Santa Terezinha do Menino Jesusaqui. Depois da minha conversão, encontrei na Igreja Católica muitos bons cristãos com disposição incrível para a caridade. O único problema é a falta de formação, infelizmente. A imensa maioria não conhece o básico da sua fé Mas isto não significa que o conteúdo da formação é falso – significa apenas que faltam bons professores. Entre aqueles que conhecem sua fé, a prática das virtudes não perde para os protestantes.
  • Material extra: eu recomendo vivamente o site do Padre Paulo Ricardo como fonte da doutrina oficial católica. Lá estão vários vídeos respondendo dúvidas comuns dos cristãos protestantes, além de aulas e cursos voltados aos católicos, para crescimento em santidade e conhecimento da fé, especialmente a seção “Resposta Católica; o site Veritatis Esplendor e o site Apologistas Católicos. Entre os apologistas católicos que acompanho, quase todos ex-protestantes, quero destacar dois (você encontra outros nomes na lista do Fábio Salgado): Scott Hahn e Dave Armstrong. Leia tudo que puder desses autores. O primeiro tem alguns livros traduzidos (encontrados aqui). O segundo é especialista em demonstrar os fundamentos bíblicos do Catolicismo (veja o site dele) e acaba de publicar seu primeiro livro em nosso idioma